Era um entardecer feito dos silêncios, desses dias, em que as praias estão vazias, o céu nublado e um vento fino começava a gelar a pele, ardida do sol que não veio. Ia mais uma vez postar-se diante da imensidão do mar... para contemplar a teimosia de uma onda que lambia seus pés, derramando suas águas salgadas e fria, para voltar correndo pra dentro dele, se encher de mais água, e mais forças, e vir novamente galopando veloz, como a noiva pintada por Chagall cujo véu se estendia ao ritmo e velocidade do cavalo que a levava em fuga. A onda que ela via se espalhando sobre as águas era o véu de Chagall que a seduzia o olhar, e embriagava os sentidos inspirando o desejo insano de codificar aquela sensação... a onda então transbordante em seus véus de espuma branca, se fortalecia a cada metro percorrido se arremessando contra uma pedra gigante, bem próxima de seu olhar observador, e que não se movia jamais. Pedra resistente aquela! Suportava todas as investidas da teimosa onda, sem se mover do lugar... sem nem mesmo se surpreender com cada partida e igual chegada mais e mais enriquecida de seus véus comandado pelo pincel e tintas de Chagall. Pensava ela, a pedra não tem como surpreender-se...vive com a certeza da onda que virá se espatifar derramando-se em lágrimas fugidias escandalosa e determinada sobre ela...tentando em vão move-la do lugar. Todas as férias voltava ali pra conferir os efeitos da onda sobre a pedra e do mar sobre elas, pra sondar a praia que expectadora permanece sem preocupar-se com o tédio daquele espetáculo de uma único ato...tudo igual...foram horas, dias, anos inteiros reproduzindo tal imagem...
Se tornou onda em todos os seus momentos de teimosia e persistência, se fez pedra pra não deslocar-se da vida que tentava escapar-lhe a cavalo em fuga e sem seus véus, se fez mar, ilimitada em seus horizontes...virou riacho algumas vezes, em pedra foi rude e preciosa,...mas permaneceu onda que se deixa engolir pelo mar ela mesma, com seus sonhos,ideias e crenças que içam velas ao vento e a navegam mar afora a dentro...se arremessa contra a pedra dentro e fora dela, imóvel em seus propósitos de ser onda,mar,pedra, praia,lugar de ser, e ficar, correr para areia, e voltar para o mar. Arrebentar-se na pedra de um jeito nunca igual, e nos fragmentos, novos sonhos com véus de Chagall...
http://en.wikipedia.org/wiki/Marc_Chagall
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