No limiar de transcender o cotidiano, como se em busca de um milagre, ou uma simples descoberta que desvenda e põe a nu as profundezas de sua alma, Clarice se vê prestes a concluir sua jornada literária. Seus personagens que habitam o presente, o futuro e um passado que não se restringe a vida na terra, mas a existências fictícias ou não, em outras formas de vida, outros espaços e tempos, estavam todos diante de sua tela prontos pra despedida. Clarice necessitava definir o seu agora, desemaranhar o fio que a prendia tênue a romper-se lento esticando-se até o limite da tensão possível. Estava muito doente e sem perspectivas de cura para a doença que a afligia apressada, como se em fuga do desmoronamento que a tornaria escombros irreconhecíveis. Afastara-se de todos e habitava agora seu estúdio fotográfico, lugar de criação de imagens para sua mais nova inspiração: a aproximação da morte, esconderijo da alegria e da insensatez, lugar de esperar o milagre. A febre voltava infalível de hora em hora a queimar as cortinas da janela de seu olhar esvoaçante pelo quarto, incendiando-lhe a face sob o véu da noite infindável e lenta. Tinha nas mãos o diagnóstico dos últimos exames de laboratório, com a recomendação para mais uma tentativa de tratamento. Uma frase curta no final da página...sentença que esperava nunca ouvir ou ler...palavras que jamais desejou ver juntas naquela composição e significados...infeliz inspiração de quem a teve, mais infeliz ainda ser tomada como indicação e solução para os designios de Clarice...qual caminho tomar insistia mais uma vez, a voz a lhe repetir...depende Clarice, depende de onde quer chegar...ela então resignada lia a recomendação que olhava pra ela ansiosa e sádica zombando antecipada da reação que traria...parar imediatamente de reler e de escrever o que tem escrito ultimamente...mudar o assunto de sua inspiração...Clarice conhecia esse antídoto para seu mal mas também os efeitos para o bem em sua vida de sonhos e poesia, de crenças na inflexão e busca que desafia a realidade...era mesmo e de fato necessário definir o seu agora...cobriu-se com seu xale enrolando o pescoço, puxando para o queixo, cobrindo a boca que mordia os lábios até sangrar...e chora baixinho seu grito de revolta e desamparo pouco antes de morrer... enquanto não inventa seu próprio milagre.
quinta-feira, 17 de maio de 2012
De novo Clarice : desamparo.
Só quem conhece Lispector é capaz de reconhecer o sentimento de desamparo que inspirou sua literatura e deu alento a tantos e tantas Clarices...Suê Galli.
No limiar de transcender o cotidiano, como se em busca de um milagre, ou uma simples descoberta que desvenda e põe a nu as profundezas de sua alma, Clarice se vê prestes a concluir sua jornada literária. Seus personagens que habitam o presente, o futuro e um passado que não se restringe a vida na terra, mas a existências fictícias ou não, em outras formas de vida, outros espaços e tempos, estavam todos diante de sua tela prontos pra despedida. Clarice necessitava definir o seu agora, desemaranhar o fio que a prendia tênue a romper-se lento esticando-se até o limite da tensão possível. Estava muito doente e sem perspectivas de cura para a doença que a afligia apressada, como se em fuga do desmoronamento que a tornaria escombros irreconhecíveis. Afastara-se de todos e habitava agora seu estúdio fotográfico, lugar de criação de imagens para sua mais nova inspiração: a aproximação da morte, esconderijo da alegria e da insensatez, lugar de esperar o milagre. A febre voltava infalível de hora em hora a queimar as cortinas da janela de seu olhar esvoaçante pelo quarto, incendiando-lhe a face sob o véu da noite infindável e lenta. Tinha nas mãos o diagnóstico dos últimos exames de laboratório, com a recomendação para mais uma tentativa de tratamento. Uma frase curta no final da página...sentença que esperava nunca ouvir ou ler...palavras que jamais desejou ver juntas naquela composição e significados...infeliz inspiração de quem a teve, mais infeliz ainda ser tomada como indicação e solução para os designios de Clarice...qual caminho tomar insistia mais uma vez, a voz a lhe repetir...depende Clarice, depende de onde quer chegar...ela então resignada lia a recomendação que olhava pra ela ansiosa e sádica zombando antecipada da reação que traria...parar imediatamente de reler e de escrever o que tem escrito ultimamente...mudar o assunto de sua inspiração...Clarice conhecia esse antídoto para seu mal mas também os efeitos para o bem em sua vida de sonhos e poesia, de crenças na inflexão e busca que desafia a realidade...era mesmo e de fato necessário definir o seu agora...cobriu-se com seu xale enrolando o pescoço, puxando para o queixo, cobrindo a boca que mordia os lábios até sangrar...e chora baixinho seu grito de revolta e desamparo pouco antes de morrer... enquanto não inventa seu próprio milagre.
No limiar de transcender o cotidiano, como se em busca de um milagre, ou uma simples descoberta que desvenda e põe a nu as profundezas de sua alma, Clarice se vê prestes a concluir sua jornada literária. Seus personagens que habitam o presente, o futuro e um passado que não se restringe a vida na terra, mas a existências fictícias ou não, em outras formas de vida, outros espaços e tempos, estavam todos diante de sua tela prontos pra despedida. Clarice necessitava definir o seu agora, desemaranhar o fio que a prendia tênue a romper-se lento esticando-se até o limite da tensão possível. Estava muito doente e sem perspectivas de cura para a doença que a afligia apressada, como se em fuga do desmoronamento que a tornaria escombros irreconhecíveis. Afastara-se de todos e habitava agora seu estúdio fotográfico, lugar de criação de imagens para sua mais nova inspiração: a aproximação da morte, esconderijo da alegria e da insensatez, lugar de esperar o milagre. A febre voltava infalível de hora em hora a queimar as cortinas da janela de seu olhar esvoaçante pelo quarto, incendiando-lhe a face sob o véu da noite infindável e lenta. Tinha nas mãos o diagnóstico dos últimos exames de laboratório, com a recomendação para mais uma tentativa de tratamento. Uma frase curta no final da página...sentença que esperava nunca ouvir ou ler...palavras que jamais desejou ver juntas naquela composição e significados...infeliz inspiração de quem a teve, mais infeliz ainda ser tomada como indicação e solução para os designios de Clarice...qual caminho tomar insistia mais uma vez, a voz a lhe repetir...depende Clarice, depende de onde quer chegar...ela então resignada lia a recomendação que olhava pra ela ansiosa e sádica zombando antecipada da reação que traria...parar imediatamente de reler e de escrever o que tem escrito ultimamente...mudar o assunto de sua inspiração...Clarice conhecia esse antídoto para seu mal mas também os efeitos para o bem em sua vida de sonhos e poesia, de crenças na inflexão e busca que desafia a realidade...era mesmo e de fato necessário definir o seu agora...cobriu-se com seu xale enrolando o pescoço, puxando para o queixo, cobrindo a boca que mordia os lábios até sangrar...e chora baixinho seu grito de revolta e desamparo pouco antes de morrer... enquanto não inventa seu próprio milagre.
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