Me peguei
naquela manhã, como me sinto as vezes, com uma vontade danada de ir embora de mim
mesma. Deixar essa parafernália de ideias que sou, parar o circuito do
pensamento, batimento do peito, o bombeamento de sangue, fluxo de ar...abandonar-me
em algum lugar e ficar olhando de longe o que acontece...se fico ali perene, se
chove e molha meu corpo, se um cão se aproxima me cheira e lambe meu rosto, se
alguém se espanta e me vê, se fico imóvel o bastante, se me canso da posição e
desisto de vez, me levanto, aprumo meu ser, me alongo e retomo o caminho que faço
com cada movimento e cada passo, no passo a passo que preciso pra me saber e me
querer, sem ter vontade mais, de me deixar em algum lugar, longe de mim perto
do mar, dentro do nada, cheia da que sou e assim, busca sem fim do que não sei
e do que pensei soubesse saber de mim.
Me peguei por fim decidida a não largar de mim, me prometi tantas coisas inclusive me cuidar feito bonsai raro e dotado a vida longa e pensei então responder pra Clarice, minha musa de tantas escritas e leituras, se eu fosse eu tomaria mais cuidado com a que sou, se eu fosse eu, criaria uma rede social pra contaminar com meu pólen e aumentar minha espécie quase em extinção e se eu fosse eu, ninguém que me conhece me reconheceria, seria bem diferente dessa que sou, se eu fosse eu seria, com certeza, esta que adoraria que fosse...se pudesse ser eu.
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