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Escolhera a maldição de Sísifo pra explicar
seu jeito de amar.
Precisava de tudo e
de todos pra ajuda-la mover a enorme esfera de pedra montanha acima e fixá-la
no topo de onde poderia então descansar seus dias e saborear a brisa mais suave
e pura a pairar sobre os altos...
Missão de todos os dias...
Esforço continuo e
permanente.
A cada passo rumo ao topo, o vislumbre do amanhã, na realização dos
sonhos... No entanto, ao quase atingir o cume, o cansaço é aumentado pelo
íngreme do solo inóspito das pedras outras tantas do caminho.
Ao ajustar as garras
presas fincando o pé, força toda, braços e pernas, um deslize e então toda a
jornada é perdida, rola montanha abaixo a enorme esfera enterrando-se na lama tornando
ainda mais difícil o recomeço da subida...
Hora de curar as feridas causadas
pelas ultimas tentativas...encontrar o aconchego que amorna o coração e deixar
molhar a face ressequida, bonsai agonizante...beber na fonte da esperança,
aprender os ritos da fé e recomeçar a jornada a empurrar para cima os sonhos..até
rolar novamente...
Precisa de toda ajuda pra mover seu amor fazendo-o refletir
nas estrelas... Ocupar o firmamento...
Transgredir a galáxia dos astrônomos e cientistas,
poetas loucos...
Amor que exige o esforço de rolar montanha acima, a pedra que
teima rolar abaixo... testando sua coragem de amar desmedida, cada motivo de
viver o sonho, e com poesia, cada minuto da vida.
É como
eu quero ser, pensava ela naquele dia
repleto de perturbadoras leituras. Não tinha mais dúvidas sobre sua essência...
era mesmo fruto da própria ficção... não cabia portanto em lugares concretos
reais...partilhados...horários marcados, explicações dadas, complexos
itinerários das relações...Se fazia completar-se em seus vazios, com a inspiração
vinda das mais fecundas fontes, todas a preencher seus dias de mundo real e
brincantes fantasia...É como eu quero ser,
ela insistia. Onda feito véu de
espumas a se estender interminável... Lembrou-se de quando tudo começara:
Era um entardecer feito dos silêncios, desses
dias, em que as praias estão vazias, o céu nublado e um vento fino começava a
gelar a pele, ardida do sol que não veio. Ia mais uma vez postar-se diante da
imensidão do mar... para contemplar a teimosia de uma onda que lambia seus pés,
derramando suas águas salgadas e fria, para
voltar correndo pra dentro dele, se encher de mais água, e mais forças,
e vir novamente galopando veloz, como a
noiva pintada por Chagall cujo véu se estendia ao ritmo e velocidade do cavalo
que a levava em fuga. A onda que ela via se espalhando sobre as águas era o véu
de Chagall que a seduzia o olhar, e embriagava os sentidos inspirando o desejo
insano de codificar aquela sensação... a onda então transbordante em seus véus
de espuma branca, se fortalecia a cada metro percorrido se arremessando contra uma pedra gigante, bem
próxima de seu olhar observador, e que não se movia jamais. Pedra resistente
aquela! Suportava todas as investidas da teimosa onda, sem se mover do lugar...
sem nem mesmo se surpreender com cada partida e igual chegada mais e mais
enriquecida de seus véus comandado pelo pincel e tintas de Chagall. Pensava ela, a pedra não tem como
surpreender-se...vive com a certeza da onda que virá se espatifar derramando-se
em lágrimas fugidias escandalosa e
determinada sobre ela...tentando em vão move-la do lugar. Todas as férias
voltava ali pra conferir os efeitos da onda sobre a pedra e do mar sobre elas,
pra sondar a praia que expectadora permanece sem preocupar-se com o tédio
daquele espetáculo de uma único ato...tudo igual...foram horas, dias, anos
inteiros reproduzindo tal imagem...
Se tornou onda em todos os seus momentos de teimosia e
persistência, se fez pedra pra não deslocar-se
da vida que tentava escapar-lhe a cavalo em fuga e sem seus véus, se fez mar, ilimitada em seus horizontes...virou riacho algumas vezes, em pedra foi
rude e preciosa,...mas permaneceu onda que se deixa engolir pelo mar ela mesma, com seus sonhos,ideias e crenças
que içam velas ao vento e a navegam mar afora a dentro...se arremessa contra a
pedra dentro e fora dela, imóvel em seus propósitos de ser onda,mar,pedra,
praia,lugar de ser, e ficar, correr para
areia, e voltar para o mar. Arrebentar-se na pedra de um jeito nunca igual, e nos fragmentos, novos sonhos
com véus de Chagall...
http://en.wikipedia.org/wiki/Marc_Chagall
Somos personagens ou seres reais?
Vivemos de fato ou somos ideias, ficção de
nós mesmos?
Nossa poesia é mero código arrumado pra ter
sentidos ao leitor, ou simplesmente sonho, fantasia, desejo de ser um dia...
Escrever eu prometo ... é a mais fácil que
viver pra realizar a promessa?Quem vai
cobrar o que escrevi desejar?Eu mesma?Qual será o compromisso do escritor com as
afirmações que faz / Limita-se a apoiar-se na liberdade poética? Criativa? Não
tem mesmo que pensar sobre os efeitos de sua escrita?No leitor...nele mesmo o
autor?
Permitir o amor liberto de grilhões da paixão
na escrita é a mesma coisa que deixar a pipa, ao sabor do vento, estraçalhar-se
nas torres, rasgar-se toda nos galhos, incendiar-se no fio elétrico? Ser cinza
voando com sobras de eternidade...
Confessar o desejo de perpetuar no amor é
mais fácil que juntar nossas coisas e partir sem direção que não a do coração
sem juízo... a nos indicar caminhos íngremes intransponíveis pela razão...
Somos fruto de nossa própria ficção... Solitária
ou repleta de momentos feitos de inspiração a percorrer cada dia desta vida sem
ter nunca a certeza se somos real ou se mera e brincante fantasia...