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segunda-feira, 30 de maio de 2011

Ruidoso silêncio


Foto Suê - Monte San Savino - Itália 2010
A feira de rua se desmontava e com ela as bonecas manequins...

Passava pelas ruelas labirinticas da cidadela medieval... a procura de resquícios de minha origem...um olhar que me capturasse os sentidos e me fizesse sentir descoberta...deparei-me com um final de feira típica  local...queijos, carnes, sementes, frutas, verduras e utensílios das mais diversas ordens, se misturavam com brinquedos e  roupas...os feirantes apressados acomodavam suas mercadorias em caixas e sacolas...hora de ir para casa...finito labore...me esgueirando na confusão das pessoas...atordoada pelos cheiros e sons...excitada com a sintonia  daquela orquestra ditosa...para quem eu era apenas uma desconhecida e curiosa...foi então que eu a ví...esbelta e mediana ali...framentada...espalhadas suas partes pelo chão...me detive...olhando-a profundamente e emocionada.. e então... envergonhada ela se vira de costas, escondendo o rosto descoberto pela cabeça desnuda de cabelos...a melancolia tomou conta de mim...meu olhar percorreu o chão de pedra deparando-me com seus membros superiores soltos pelo chão ao lado de seu busto...que permanecia de costas para mim...e bem próxima... como se os vigiasse, seus quadris que se mantinham sobre as pernas em pé numa cena, no mínimo sombria...pensei em falar com ela...ouvir sobre como se sentia...estava só...ninguém ao seu lado a lhe fazer companhia...segurar sua mão fria...ah como desejei conhecê-la...mas meu mal falado italiano e seu dialeto local impediram nossa comunicação...restou-me então acenar para ela com minha câmera num pedido de consentimento para uma foto...nos despedimos em silêncio e ainda hoje penso nela...sua presença em minha estéril busca na velha San Savino...nosso diálogo exótico...e o ruidoso silêncio em mim provocado.

Nova mente novamente nova mente nova...


Suê - pastel oleoso - Coletânea Lugares Mostra 1996
acervo pessoal - recorte.

Novamente...
Na torre velha toca um novo sino...E na varanda um vaso novo... exibe uma velha cor...No sol que gira... brilha um novo dia...Na cor do pé... do velho girassol...Um novo sol bate... no velho peito...No céu... a noite é lua de mel...
Um beija flor cupido... transporta algo novo...No dedo esquerdo existe um velho anel...A porta bate e fecha...mais de cem mil vezes...só pra ver de novo se abrir...e novamente ver tudo de novo...na velha torre ...o novo sino acorda o velho..de mente nova...pra nova mente...ver tudo de novo... a lua nova exibe aquele novo véu...que ficou velho na mente do novo namorado...a decidir sobre algo novo em seu velho papel...mas fica velho lendo de novo o mesmo jornal...e de novo a nova mente deixa de ser nova, novamente...

Poetizando fragmentos de 1997

Foto Suê - 2010 -  bar na rua Lyon, França .
mesa vazia de pessoas...

Ser poeta na pós-modernidade
É compor versos vanguardistas
Da emoção virtual

Prá falar deste tempo e resistir em sonhar
Sem programar espantos e sentimentos
Na programação que exclui
Ingresso e bilheteria...
Em que se clica mecânica e intencional
Um mouse
Que dispensa ratoeiras e cuidados com o queijo
Esquecido sobre a mesa do jantar dos deuses
Que degustam refinados sabores artificiais
E se prostram passivos e estáticos diante da tela
Que não exibe um Renoir
Mas luz cegante do vídeo
Pra compor um poema sem falar do amor antigo
Ser moderno, atual, global, planetário e mundial
Há que desistir do particular, amante e amigo
Rever a inspiração limitada na emoção passional
Buscar a razão pura, na técnica lúcida e lógica
Fazer o inventário dos escritos de Cervantes
Vacinar o cavaleiro da triste figura e errante
Antes que Dulcinéia revele sua identidade robótica
E cause espanto em hora imprópria
Imprópria e ainda mais alucinante
Ser poeta na pós-modernidade
É compor versos vanguardistas da emoção virtual
Mundos imaginários ilusões de utopias
Não do amor irreal, mas projeção da nova era
Em que vãs tecnologias não superam
O que não deu conta
Dos mistérios entre o céu e a terra
Nossa vã filosofia

Quixote - pastel oleoso - Suê -1995 acervo pessoal.

Dulcinéia

Sue 2009 - acervo pessoal (arte em tecido)
Dor, Saudade, Morte, Desejo, Vida, entrecortam a cena de Dulcinéia que protagonizo...Interrogo...:

A ameaça da morte potencializa a vida?
Os encantos esfumaçados pelo tempo  podem ser revitalizados pela dor?
A saudade é capaz de reinventar o presente e trazer novos desenhos e cores a paisagem?
Os sentimentos mortos reencarnam numa mesma vida?
No processo de morrer enquanto vive, a vida se renova na própria morte?

Permaneço viva quando, no esforço de compreender a morte, recupero a essência do desejo que me move e me pulsa, e me arrebata como Quixote na luta contra as pás dos moinhos de seu próprio vendaval?

Além dos moinhos de vento com suas pás cortantes, o que mais protagoniza-nos o ataque, em meio a batalha que travamos conosco mesmo para mostrarmos nossa face de Dulcinéia... não tão doce como as temperam... nem tão bela quanto as desenham... nem tão frágil como as projetam...nem tão tosca como as acusam...nem tão cega como as preferem...????

Libertária

Sereia - Suê - 2010 (arte em tecido) para o acervo de  Sonia Bianco
Sereia libertando os peixes e outros animais prisioneiros da rede desleal...
No percurso que ela faz, carregando para longe a rede estabelece-se o esforço pela liberdade...esforço válido por qualquer meio capaz de construir o ser liberto... esforço cujo meio facilitador reside na criação...
no imaginário....que idealiza, torna pensamento, desenha, arquiteta e constrói as formas de sereias...vampiros...anjos...avatares...e os convoca a todos mobilizando a jornada...determinação irrevogável que o labirinto caótico exige...caótico por ofuscar seus acessos, criar obstáculos, escamotear, escondê-la: a liberdade... 

Teimosa e doce... saudade

Foto Toinie - Lisboa 2010
Imaginei você comigo e lhe dei esse sorriso...pra você.
Visitei lugares que combinamos ver juntos...e você não esperou...Continuo em San Savino no alto do entardecer...pra  te encontrar...Busco incansável ser leve e seu descanso não perturbar...Tento cumprir a promessa de flutuarmos juntos na sua liberdade...Exercito a leveza na meditação pra te alcançar...
Hoje tomamos chá juntos...Toquei violão e cantei pra você...uma canção que aprendi com uma banda jovem veiculada na rede...e fala de oração...meus dedos desacostumados e com o frio se arrastaram pelas cordas...acho que você gostou... pelo menos não chorei...Continuo lendo pra você tudo que acho lindo...também os meus escritos pra você compoem meu maior arquivo...e acredito que tem lido...pode me responder se desejar...se eu merecer...pode vir no meu sonho... como fez poucas vezes...no pensamento você já vive...sempre me achou teimosa...agora vivo teimosa na saudade de você...

domingo, 29 de maio de 2011

Singularidade

Foto - Suê 2010 - Lyon França.
Cadeira a minha espera para um chá.
 Em meio a multidão sou mais um a caminhar em marcha de  protesto. Nela dezenas de milhares de pessoas interditam a maior avenida da capital do maior estado do maior país do mundo...
Da multidão, não sou apenas uma parte, tornei-me ela... e nela não consigo ver o horizonte, não tenho perspectivas...sou mantida nesse estado...a espera de um dia  conhecer-me...como multidão...ou fragmento dela...
Na caminhada repetindo palavras de ordem, sou levada pelos passos grudados nos meus...
A multidão estendida num zoom ao contrario, se fecha em mim, limitando-me aos vizinhos caminhantes, restringindo-me a visão à pessoa da frente, da direita e da esquerda, seus corpos... seus pés.
Experimento a louca sensação de estar engolida por ela, a multidão...em suas entranhas me revolvo debaixo do céu aberto lutando pelo ar...tento reconhecer meu entorno, mas para isso tenho que me voltar, mudar de lugar, arriscar  perder a referência dos lados e da frente, perdendo a direção de mim mesma... desaparecendo em multidão...


Como construir a visão da multidão nela entranhado?


Tentando fixar o olhar no mais próximo de mim, avisto uma coluna erguida sobre um elevado a um metro do chão. Num impulso desloco-me e subo. Do ponto mais alto experimento a visão da totalidade descolada das referências, liberta das palavras de ordem e da direção... vejo a multidão estendida se perdendo da vista...experimento a sensação do todo...limiar do conhecimento...

Melancólica, percebo que estou só com  meu olhar aventureiro a desenvolver a solitária experiência, sensação e leitura sobre a visão da multidão....dela em mim tornando-me coletivo...e minha singularidade a perde-se nela...
Mais tarde retomei essa aventura e constatei que estar entranhado na multidão é uma condição imposta a ela própria: a multidão, para que não consiga reconhecer-se, avistar-se em suas singularidades... ser multidão é assustador...ameaçador...nela tudo pode acontecer e por isso nada de fato significativo e transformador acontece...

Pensei então na escola e o quanto ela nos mantém entranhados na multidão, vendo muitos pés e as poucas cabeças que nos circundam... vivendo sem o conhecimento sobre nós mesmos, nossa potencialidade e poder de criação e transformação....

A mim só me resta deixar a escola, sentar na varanda e tomar um chá...

Foto Suê Saint-Rèmy - Sul da França
Vista interior de muralha medieval, janela por onde ví o céu, o sol, a liberdade, minha singularidade...
  

sexta-feira, 27 de maio de 2011

O brinquedo abandonado...


foto Suê Galli - Gordes - Sul da França, 2010.
Numa das ruelas da pequena cidadela medieval, uma janela fechada, um brinquedo de menina esquecido
 passei por aqui e trouxe comigo o que vi.



Sobre Escrever e Liberdade


ESCRITA NA TELA: Entre fios elétricos e a lua a cidade salta pelas cores, pede ajuda... Tela de Suê Galli, 2009, doada para fundo de projeto social -  por meio de leilão -  adquirida por Orlik.
 Escrevemos para transformar o que sabemos e não para transmitir o já sabido...ao escrever liberamo-nos de certas verdades, deixando de ser o que somos para ser outro(a)diferente do que vimos sendo.  Assim, o que conta  ao escrever é a experiência e não a verdade...é o que dá sentido ao que escrevemos...é o significado desse sentido para a experiência de escrever...por outro lado, a abstração que nos conduz  ao desejo e  ato de escrever produz elementos importantes para a emancipação cognitiva e intelectual.
Desta forma só podemos pensar a educação como aquela que transforma o que sabemos, muito mais do que transmite o já sabido...pela emancipação intelectual deixamos de lado os grilhões dos modelos e das verdades prontas absolutas...alcançamos a liberdade  de pensar, decidir, ser, fazer...escrever...criar...reinventar o mundo...transformar segredos em anúncios portadores de conhecimento, consciência e felicidade...

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Nem ficção...nem fantasia...

foto Suê - 2010
passagem - Gordes, França
Eu estava lá,de novo, outra vez...
A mesma noite e lugar... a mesma lua escondida,
espera contida, história repetida...
Mesma noite da outra vez, e a mesma que era eu...
Noite escura,  riscos de sanidade... loucura...Pronta pra fazer tudo de uma só vez...mais de uma vez...
Um texto pra ler e uma denúncia no anúncio a fazer...
Um traço, um desenho, uma pintura...
Um rascunho, um poema em arquitetura...
Um mirar, um cenário e uma fotogravura
Um tempêro, um deguste, um sabor in natura...
Um desejo,uma atitude, uma procura...
Na penumbra um quê de terror... excitação... sedução...
na tela determinismo, tracejo, rascunho, pincelo, me atiro
naquela sensual missão...de estar ali de novo, outra vez na mesma noite e lugar...tempo e acontecimento...
Mesma lua escondida...espera e história repetidas
No mesmo encontro...
No mesmo eu...
Do outro que sou.

Série Anjo - foto Suê - Itália - 2010

domingo, 22 de maio de 2011

Uma boa companhia

Ali  expostas lado a lado mediadas pela mesa sem toalha nem talheres... sem lugares ocupados vão ficando...

...a espera de um par de idéias, de palavras e um bom papo...

Acanhadas e vazias, misteriosas simbióticas, segredam mil histórias povoadas de raríssima alquimia...

Ficam lá as cadeiras a espera de uma boa companhia... 

Vamos nos sentar?

Queda livre

De caso pensado, vesti minha vontade com a cor da coragem, postei-me no mais alto do alto, desenhei o gesto, abri os olhos e os sentidos e saltei...

Caí dentro do livro...

Num movimento feito de fuga do tédio e de busca ao saber, somado ao febril desejo de descoberta e do novo...não havia tempo a perder, mas sim conhecer o entorno: título na capa dura estampada... o mapa de temas e lugares alfabéticos...

As portas diante de mim se abriram e na ante-sala o sumário me acolheu, com seu elenco de assuntos e autores numa projeção em perspectiva do percurso e jornada...

Dei início a aventura pelas estradas de palavras que unidas solidárias carregavam sensações, e nas descrições de lugares, dos tempos e situações construíam caminhos em concordância...abriam picadas nas entranhas da linguagem codificada de sentidos significantes ou complexificantes... 

Eu não sei por quanto tempo fiquei embriagada com a absorção de conceitos e composições, significados e suposições, de realidade e fantasia, negativas e afirmações, temperando com alquimia, meus sentidos e a razão, levando-me aos motivos que me fizeram querer

ficar pra sempre no livro...

quinta-feira, 19 de maio de 2011

LOUIS LAMBERT: fragmento de um projeto literário futuro próximo

Meu percurso de leitora e escritora começou com Louis Lambert 


...e eu estava ali diante da biblioteca do Capitão Bernardino, mulato, herói de guerra, letrado, personagem do meu imaginário infantil, de farda oliva e estrelas de metal enfileiradas no peito e ombros.


A estante com portas de vidro, protegia do pó e da luz as preciosas obras de edição italiana, lombada em ouro e capa de couro, no silêncio guardião das letras e frases de personagens e narradores que, emudecidos aguardavam ser despertados para viver de novo na leitura.


Um tesouro precioso que eu aprendi admirar fugidia e aventureira pela imponência que causava e pelo contexto em que me encontrava.


Meu olhar se derramou sobre um pequeno volume que me encantou com suas letras em ouro que soletrei: Honoré de Balzac. Fiquei ali namorando o pequeno livro e sem que eu percebesse, o homem alto e volumoso aproximou-se com seu andar de marcha soldado, que eu já conhecia e respeitava. Chegou até a estante, abriu com uma chavinha a porta de vidro e ordenou-me: Escolha um. Em pânico e excitada como quem se vê próximo do impossível revisado, não tive dúvida fui direto ao pequeno Honoré de Balzac.


Corri para minha casa simples e ausente de livros, letras e frases, imaginários  e narradores, repleta de realidade e de personagens de carne e osso, me tranquei no quarto folheando o livro como um tesouro.


Um título me atraiu à leitura: Louis Lambert. Era um conto de Arthur Schopenhauer o filósofo de Dores do Mundo. Tratava sobre um garoto que passou a povoar minha infância e juventude. Aos dezoito encontrei Louis Lambert, um colega de escola, doce melancólico, míope, quase deprimido que passou a ser meu companheiro no trajeto para casa à volta da escola. Eram noites infinitas e estreladas para o qual a distância não existia. Conversávamos sobre letras, frases, personagens e narradores que descobríamos e trazíamos para nossa poesia concreta que tão bem adjetivava nossa amizade. Nos apaixonamos, porém a morte do Louis Lambert de meu amigo, o tirou de mim.


Nos tornamos desde então, letras, frases, personagens e narradores na busca incessante de Louis Lambert.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Melancolia e Loui o Vampiro

Este é Loui  um vampiro que transportei da literatura de Anne Rice (Anne Rice (Nova Orleans, Louisiana, 4 de Outubro de 1941) é uma escritora norte-americana, autora de séries de terror e fantasia) e o reinventei para minha pintura. Este reinventado Loui habita  minha melancolia e das pessoas, vagueia solitário pelas noites da alma a procura de vítimas da dor, da mesma dor que soma com a que carrega há mais de dez séculos numa imortalidade cruel.

Encontrar Loui significa aprofundar na tristeza, conhecê-la, justificá-la e torná-la delicadamente bela, leve, suave... A melancolia que alimenta Loui dentro de nós, é nossa companheira silenciosa e inspiradora. Aloja-se nos compartimentos mais secretos de nosso ser e deixa frestas para o sol entrar e aquecer a alegria adormecida, despertando-a... 

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Do outro lado do rio tem um outro lado.

Estive lá e pude ver
O outro lado do rio
Outra margem de possibilidade
Outra chance para o recomeçar
Outra perspectiva
Outro lado
Outro rio
Outra eu

Outra eu