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quinta-feira, 28 de março de 2013

Costureirinha da Corte

Saltou cedo da cama, vestiu-se, correu para a sala de costuras e  juntou-se com as demais costureiras que atravessaram a madrugada, debruçadas sobre os vestidos para o próximo baile da corte.

Seu compromisso era com a calça de seu nobre e galante soldado, cavaleiro do Reino.

No último combate, defendo as honras do Rei,  feriu-se e teve sua farda destruída na altura dos joelhos. Coube a ela restaurá-la.

Ficou lisonjeada pois sabia dos seus encantos, correntes nas rodinhas de mulheres por todo o palácio. Elegante, Olhar de segredos, Calado, misterioso, gentil, delicado, de beleza singular, porte gigante, e braços capazes de contornar os sonhos de uma costureirinha como ela.

Hoje ele viria fazer a ultima prova e finalmente  poderia vê-lo pessoalmente.

Mal dormira aquela noite que antecedeia o arremate da costura e a prova.

Durante o feitio com a calça entre as mãos podia ver seu corpo dentro dela. Suas pernas fortes e cheias de músculos, cicatrizes de herói espalhadas feito desenhos tatuados, troféus da vitória. A cintura delgada como de uma Princesa, escondia um mistério encantador.

Por vezes se via abraçada com a roupa presa entre as mãos coladas em seu peito.Seu cheiro estava lá. Sua energia toda se mantinha nela, podia sentir seu pulsar. A emoção lhe tomou a garganta e uma vontade louca de beijá-lo a fez inventar os detalhes desse sonho. Mas não dormira para sonhá-lo.

Separou suas saias de renda e avental bordado, perfumou o corpo, carmim nos lábios, um ramo de flor de laranjeira prendeu nos cabelos e esperou o dia clarear.

Já no salão das costureiras, terminado o trabalho, avisaram de sua chegada. Tinha que espantar a timidez. Correu em sua direção com a peça nas mãos. Ele estava lá parado  fitando-a.

Suas pernas tremiam, seu coração pulava tentando achar um lugar seguro dentro do peito arfante. Ele a viu! Sentira isso. Olhara dentro de seus aposentos secretos e se viu lá com ela no sonho que inventou. Sorriu. As outras mulheres de longe, excitadas, assanhadas, mal continham gritinhos de euforia, esfregavam as mãos, se abanavam o calor, quase se tocavam o próprio corpo cheio de contido e insatisfeito desejo.

Ele só tinha olhos pra ela que estendeu a peça e perguntou Vai provar? Ele sem titubear foi tirando a farda. Pode ver suas ceroulas longas de cor cinza colada ao corpo daquele Adônis de seus sonhos. Estava diante dela. Virou o rosto e só se voltou quando terminado. Ele dizia com voz límpida e forte. É a minha preferida, obrigada ficou ainda melhor, como conseguiu? Sem graça falou ...eu também não sabia que conseguiria...se tiver outras posso tentar. Ele então se inclinou pegando-a com as duas mãos pela cintura, puxando-a para seu corpo sentou-se no banco próximo de  e a colocou em seu colo. Era o sonho que ela inventara acordada por falta de sono. Então acariciou seus cabelos aproximando os lábios. Não queria parecesse uma mulher vulgar e fácil, mas...sabia que fácil não era mesmo. Quando uma costureira da corte, escravizando seus dias cinzentos dentro daquele imenso salão, rodeado de mulheres bisbilhoteiras, largadas e gordas,  de dedos rasgados pelo trabalho insano das agulhas rombudas e ferinas, bocas de dentes faltantes, quebrados, escuros, quando viveria algo assim? Ser uma delas era o seu destino. Mas ela sabia inventar sonhos. Quando ele se despediu deixou entre meus seios um lenço com seu nome: Loren. Ao voltar para a costura, ainda com a pressão de suas mãos amassando-lhe as vestes, tocando-lhe o ser, as mulheres a rodeavam com perguntas toscas: Afinal quem era essa jovem? É mesmo o soldado do Rei? Mas não seria uma donzela?De onde tira aquela força para te abraçar?Você está apaixonada? O que pretende fazer?Ele ou ela pertence a linhagem nobre de guerreiros? Delicado demais para um cavaleiro! Deixem-nos ver o que tem ai entre os seios! Foi tomada de uma vertigem escurecedora e fria. Atiraram-se todas sobre ela, rasgando-a inteira, derramaram suas frustrações todas sobre seu sonho, sentia o cheiro azedo delas sobre si. Tirou-se dali voando nos pensamentos. A noite escureceu o lugar. Espalhadas pelo chão as flores de laranjeira. Um lenço de renda em pedaços soletravam um nome...Acordou nos braços de Loren.

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